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Quando o silêncio vira cúmplice: o gesto da RTVE no Eurovision 2025

Em meio a ameaças de sanção da União Europeia de Radiodifusão (UER), a emissora pública espanhola RTVE exibiu um manifesto em defesa dos direitos humanos antes da final do Eurovision 2025.

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Há momentos em que cumprir ordens é sinônimo de omissão. E há instituições que, em nome de uma suposta neutralidade, transformam o entretenimento em escudo para a injustiça. O que vimos na final do Eurovision 2025 foi exatamente isso: um festival que, sob o lema “Unidos pela música”, escolheu desunir o discurso da consciência.

Pressionada por uma carta da União Europeia de Radiodifusão (UER), a emissora pública espanhola RTVE foi proibida de repetir, na final, o que já havia feito na semifinal: citar as mais de 50 mil vítimas dos bombardeios em Gaza (70% das vítimas são mulheres e crianças), número reconhecido pela ONU. O aviso veio com tom ameaçador — se os comentaristas ousassem mencionar os mortos, a emissora seria multada. A liberdade de informar, nesse contexto, foi tratada como infração.

Ainda assim, a RTVE respondeu. Não com palavras, mas com dignidade: antes do início da transmissão, exibiu uma tela preta com a mensagem, em espanhol e inglês:

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Foi um gesto simbólico. E poderoso. Um ato de resistência serena diante da hipocrisia institucionalizada de uma organização que se diz apolítica, mas responde com celeridade aos interesses de um país membro e ignora violações reiteradas do próprio regulamento — como no caso da KAN, emissora israelense, que já coleciona dezenas de descumprimentos sem advertência formal.

A neutralidade seletiva da UER

Ao silenciar menções a uma tragédia humanitária, a UER expõe o esvaziamento ético do Eurovision. Afinal, a mesma organização que baniu a Rússia em 2022 após a invasão da Ucrânia, agora se mostra incapaz de lidar com a participação de Israel, país também envolvido em um conflito devastador e prolongado.

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A justificativa? Preservar o “caráter apolítico” do festival. Mas desde quando falar de direitos humanos virou posição política? Desde quando informar sobre crianças mortas equivale a tomar partido? A UER não proíbe política — apenas proíbe o desconforto moral de seus patrocinadores e aliados estratégicos.

O gesto da RTVE, ainda que contido, revelou o abismo entre a propaganda e a prática. Quando seus apresentadores foram forçados a falar de Israel com frieza robótica, sem menções ao contexto, sem emoção, sem memória, o que vimos foi um jornalismo algemado. Mas quando a emissora decidiu começar sua transmissão com uma mensagem silenciosa, escolheu o lado certo da história — o lado que, no futuro, será lembrado como o que não se calou.

RTVE, uma voz dissonante no coro da conveniência

Neste editorial, não se trata de fazer apologia a países ou bandeiras. Trata-se de reafirmar que o entretenimento não pode ser blindagem para o sofrimento humano. Que a arte — inclusive a canção — carrega responsabilidade. Que o jornalismo, mesmo em contextos festivos, precisa ter coragem.

A RTVE foi uma exceção que nos dá esperança. Seu gesto, simples e direto, foi um lembrete: nem sempre é possível falar. Mas sempre é possível não se omitir.

Enquanto a UER escolhe punir quem denuncia e proteger quem viola, o público — esse sim, unido pela música — começa a perceber que há algo errado nos bastidores do palco. E talvez, nos próximos anos, a verdadeira transformação do Eurovision venha de quem ousar desafinar.

Há momentos em que cumprir ordens é sinônimo de omissão. E há instituições que, em nome de uma suposta neutralidade, transformam o entretenimento em escudo para a injustiça. O que vimos na final do Eurovision 2025 foi exatamente isso: um festival que, sob o lema “Unidos pela música”, escolheu desunir o discurso da consciência.

Pressionada por uma carta da União Europeia de Radiodifusão (UER), a emissora pública espanhola RTVE foi proibida de repetir, na final, o que já havia feito na semifinal: citar as mais de 50 mil vítimas dos bombardeios em Gaza (70% das vítimas são mulheres e crianças), número reconhecido pela ONU. O aviso veio com tom ameaçador — se os comentaristas ousassem mencionar os mortos, a emissora seria multada. A liberdade de informar, nesse contexto, foi tratada como infração.

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Ainda assim, a RTVE respondeu. Não com palavras, mas com dignidade: antes do início da transmissão, exibiu uma tela preta com a mensagem, em espanhol e inglês:

Foi um gesto simbólico. E poderoso. Um ato de resistência serena diante da hipocrisia institucionalizada de uma organização que se diz apolítica, mas responde com celeridade aos interesses de um país membro e ignora violações reiteradas do próprio regulamento — como no caso da KAN, emissora israelense, que já coleciona dezenas de descumprimentos sem advertência formal.

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A neutralidade seletiva da UER

Ao silenciar menções a uma tragédia humanitária, a UER expõe o esvaziamento ético do Eurovision. Afinal, a mesma organização que baniu a Rússia em 2022 após a invasão da Ucrânia, agora se mostra incapaz de lidar com a participação de Israel, país também envolvido em um conflito devastador e prolongado.

A justificativa? Preservar o “caráter apolítico” do festival. Mas desde quando falar de direitos humanos virou posição política? Desde quando informar sobre crianças mortas equivale a tomar partido? A UER não proíbe política — apenas proíbe o desconforto moral de seus patrocinadores e aliados estratégicos.

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O gesto da RTVE, ainda que contido, revelou o abismo entre a propaganda e a prática. Quando seus apresentadores foram forçados a falar de Israel com frieza robótica, sem menções ao contexto, sem emoção, sem memória, o que vimos foi um jornalismo algemado. Mas quando a emissora decidiu começar sua transmissão com uma mensagem silenciosa, escolheu o lado certo da história — o lado que, no futuro, será lembrado como o que não se calou.

RTVE, uma voz dissonante no coro da conveniência

Neste editorial, não se trata de fazer apologia a países ou bandeiras. Trata-se de reafirmar que o entretenimento não pode ser blindagem para o sofrimento humano. Que a arte — inclusive a canção — carrega responsabilidade. Que o jornalismo, mesmo em contextos festivos, precisa ter coragem.

A RTVE foi uma exceção que nos dá esperança. Seu gesto, simples e direto, foi um lembrete: nem sempre é possível falar. Mas sempre é possível não se omitir.

Enquanto a UER escolhe punir quem denuncia e proteger quem viola, o público — esse sim, unido pela música — começa a perceber que há algo errado nos bastidores do palco. E talvez, nos próximos anos, a verdadeira transformação do Eurovision venha de quem ousar desafinar.

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